Adaptação Estratégica: Integrando Criptomoedas em Portfólios Institucionais

Pravatta
10 min readMay 3, 2024

Depois de muitos anos sendo criticados pelo mercado financeiro tradicional, o Bitcoin e as criptomoedas finalmente começaram a ganhar um espaço no portfólio de investidores no mundo todo, mais notadamente nos Estados Unidos após a SEC aprovar 11 ETFs de Bitcoin à vista no dia 10 de janeiro desse ano.

Mas a jornada do Bitcoin não foi fácil até aqui.

De acordo com a 99Bitcoins desde 2010 o Bitcoin foi declarado como morto pela mídia tradicional 477 vezes.
Além disso grandes nomes do mercado financeiro possuíam uma visão muito negativa do mercado cripto.
Em 2017 quando este autor já investia em criptoativos, Jamie Dimon, CEO do JP Morgan dissera que o Bitcoin era uma fraude. E ainda no mesmo ano Larry Fink, fundador e CEO da BlackRock, dissera que a criptomoeda era um índice de lavagem de dinheiro.
Pouco mais de 6 anos depois em 2023, o mesmo Larry Fink começou a defender o Bitcoin e o chamou de ouro digital, logo após a sua empresa BlackRock solicitar aprovação da SEC para um ETF à vista do ativo.
E curiosamente, o JP Morgan se tornou um dos participantes autorizados do ETF da BlackRock.

Mas por que essa mudança repentina em favor das criptos?

Simplesmente porque inovações tecnológicas de grande impacto como os ativos que rodam em blockchains representam mudanças profundas e sofrem resistência da maioria das pessoas no início da adoção.
Esse mesmo fenônomeno aconteceu com a internet nos anos 1990.

Quem se recorda do ganhador de Nobel da Economia dizendo nos anos 90 que o impacto da internet seria igual o do fax?

E não é somente com a internet que ocorreu esse fenômeno.
Isso também é observado no surgimento da locomotiva, lâmpada elétrica, telefone, carro, televisão, etc.
No livro “Engines that moves markets” de Alasdair Nair, são mostradas diversas frases ditas também por várias pessoas consideradas inteligentes em cada época, que lidas hoje em dia parecem piada.

A mente humana não é boa para lidar com mudanças bruscas.

O Bitcoin e as criptomoedas ainda estão na infância. Conforme imagem 1, em adoção de usuários no mundo cripto, seria como se estivéssemos como a internet de 1999.

Imagem 1 — Adoção de usuários: internet x cripto

Porém esse movimento de adoção começou a acelerar esse ano com o lançamento dos ETFs nos Estados Unidos.

Existem cerca de 3000 ETFs no mercado financeiro em geral nos EUA e o IBIT, sigla do ETF de Bitcoin da BlackRock, está entre os 10 que mais receberam entrada de capital em 2024.

Desde que foram lançados os ETFs no início de janeiro o fluxo de entrada acumulado foi de aproximadamente $12 bilhões de dólares, no momento em que escrevo esse artigo.

A média de entrada diária está em cerca de 175 milhões de dólares desde o lançamento.
Essa quantidade é extremamente alta, principalmente comparando com a emissão diária de apenas 450 bitcoins (BTC).
Na cotação atual de cerca de 65 mil dólares por BTC, isso equivale a aproximadamente 30 milhões de dólares.

Bitcoin é mais escasso que o ouro.

O ouro possui inflação anual de aproximadamente 2% ao ano. Já o criptoativo possuía inflação de 1,8% ao ano até 19 de abril desse ano.
Porém a cada 4 anos o Bitcoin é programado para cortar pela metade sua emissão e agora está 0,9% ao ano.
Essa característica foi programada quando a criptomoeda foi lançada e seguirá reduzindo sua emissão até 2140 quando o ativo irá cessar sua emissão.

A comparação com o ouro é muito pertinente porque o metal foi usado como dinheiro durante muitos milênios e até hoje muitos investidores possuem ouro no portfólio, principalmente visando momentos de instabilidade financeira, guerras e períodos inflacionários.
E um dos principais atributos do uso do ouro como reserva de valor é sua escassez e emissão limitada.

O mundo está presenciando agora um novo ativo com maior escassez que o ouro e um crescimento exponencial de adoção parecido com a da internet.

Somente esse ano o Bitcoin se valorizou cerca de 55%, de 42000 dólares para 65000 dólares.

E esse parece ser somente o começo.

Como comparação o primeiro ETF de ouro nos EUA foi lançado no final de 2004 e o metal amarelo subiu praticamente 7 anos seguidos com uma valorização de 350%.

Imagem 2 — Valorização do ouro em dólares de 2004 a 2011 depois que foi aprovado ETF nos EUA

Quais os benefícios de incluir criptomoedas nos portfólios institucionais?

Investir em criptomoedas pode ser uma excelente maneira de diversificar o portfólio, ganhar exposição a uma classe de ativos que está apresentando crescimento exponencial e adoção parecido com a internet e as ações de empresas de tecnologias dos Estados Unidos e aproveitar a grande entrada de capital que está entrando nos ETFs do Bitcoin nos Estados Unidos.

Além disso o Bitcoin tem sido um dos poucos ativos que consegue superar o grande aumento da liquidez global nos últimos 12 anos.
Desde 2008 quando ocorreu a última grande crise econômica, os bancos centrais do mundo todo usaram medidas não ortodoxas para conter a crise como o “Quantitative Easing” e manter juros perto de zero ou até negativos, visando estimular a economia.
Conforme a imagem 3 é possível perceber que a liquidez global tem aumentado muito com alguns pequenos momentos de contração em ciclos que costumam durar aproximadamente 4 anos.
O preço do Bitcoin está representado com os candlesticks e a liquidez global representada em azul contém o agregado monetário M2 das maiores moedas globais: dólar americano, euro, iene japonês, yuan chinês, libra esterlina inglesa, rupia indiana, rublo russo, real brasileiro, peso mexicano, dólar canadense e dólar australiano.

Imagem 3 — Preço do Bitcoin em dólares americanos comparado comparado com a liquidez global (M2)

Estamos apenas iniciando uma onde de alta de liquidez global que provavelmente deve durar pelo menos de 1 a 2 anos.
Além disso os bancos centrais no mundo todo apenas estão começando a baixar juros, o que deve estimular ainda mais a o aumento da liquidez global.
A China já está estimulando a economia, o banco central brasileiro já fez alguns cortes de juros e o presidente do banco central americano já sinalizou que deve começar a cortar juros esse ano.

Além disso a maioria dos países do mundo estão altamente endividados, incluindo os Estados Unidos, que tem a maior economia do mundo, conforme a imagem 4.

Imagem 4 — Dívida Governamental dos Estados Unidos

Esse aumento gigantesco da dívida pressiona o Banco Central Americano a cortar juros para quando o governo for refinanciar essa dívida e em última instância o próprio banco central cria dinheiro para comprar a dívida do governo.
Esse é o cenário em que o Bitcoin e as criptomoedas se beneficiam amplamente do aumento da liquidez global.

É importante notar que existem mais de 10.000 criptomoedas, porém assim como no mundo das startups, a grande maioria vai falhar.
Atualmente as maiores são Bitcoin (BTC) e Ethereum (ETH), que somadas representam 70% da capitalização total do mercado de criptomoedas, de aproximadamente 2,5 trilhões de dólares.
O Bitcoin sozinho representa cerca de 54% da capitalização total do mercado cripto e o Ethereum 16%.
As principais utilidades do Bitcoin tem sido como reserva de valor, permite transações sem intermediários, custódia própria e funciona como uma espécie de ouro digital e possuindo alta descentralização e resistência a ataques.
O Ethereum tem focado em outras utilidades. A moeda nativa chamada de ether (ETH), é o combustível usado para rodar os famosos contratos inteligentes que permitem a criação de diversas aplicações que exigem programabilidade como corretoras descentralizadas, finanças descentralizadas, tokenização de ativos, jogos, redes sociais, entre outras aplicações.
O grande apelo de realizar essas aplicações na Blockchain é que o usuário pode ter propriedade e custódia de itens na Blockchain, usando a camada de criptografia utilizada pela tecnologia.
Além disso o sistema é bastante transparente, flexível e facilmente auditável.

Quem já aderiu à tokenização de ativos na Rede Ethereum foi ninguém menos que a BlackRock, que criou esse ano um fundo tokenizado que já atraiu cerca de 300 milhões de dólares em depósitos.

A tese do Ethereum como investimento também é muito forte porque dentro do seu ecossistema a principal moeda utilizada é o ETH.
E o ether possui emissão atual menor que a do Bitcoin, de aproximadamente 0,6% ao ano. Quem possui ETH pode ainda travar suas moedas em um validador da rede e receber essas emissões novas chegando a render cerca de 4% ao ano em ETH.
Neste caso o ETH vira como uma espécie de bond da internet.
E além disso tem um adicional que aumenta sua escassez. A maioria das taxas usadas na rede em ETH são queimadas e por isso o ETH está sendo um ativo deflacionário desde 2021, conforme imagem 5.

Imagem 5 — ETH, O token nativo da rede Ethereum é deflacionário

No momento que escrevo esse artigo ainda não foi aprovado um ETF à vista de ETH nos Estados Unidos porém já existem ETFs em diversas partes do mundo incluindo Brasil, Europa e recentemente foi aprovado também em Hong Kong.
A possível aprovação de um ETF de ETH nos Estados Unidos seria outro grande catalisador para o ativo.
Muitas empresas, incluindo a BlackRock já solicitaram um ETF à vista do ativo nos EUA porém a sua aprovação ainda é incerta.

Portanto os grandes nomes do mundo cripto atual são Bitcoin e Ethereum.
Todos os outros ativos ainda estão em estágio muito inicial e possuem riscos consideráveis.

Pensando em um portfólio conservador de criptomoedas, faz sentido pensar neste momento somente em alocação de Bitcoin e Ethereum, podendo variar a alocação entre 75% BTC e 25% ETH sendo mais conservador e 50%/50% para um perfil mais agressivo.
Para investir em outras criptomoedas recomendo se aprofundar mais em conteúdos específicos como o da Escola Cripto.

Como incluir Bitcoin e criptomoedas em portfólios institucionais?

Bitcoin, Ethereum e outras criptomoedas são ativos que permitem que pessoas possam fazer a custódia própria.
Existem diversas carteiras no mercado em que é possível manter as chaves criptográficas de seus ativos.
Para pessoas físicas que desejam ter posse de seus ativos digitais essa é uma das possibilidades e existem muitos conteúdos no mercado como o da Escola Cripto que ensinam como fazer isso.

Porém existe relativa complexidade regulatória para adquirir ativos e manter auto custódia, além de muito disciplina para não perder as senhas e literalmente perder o acesso a seus criptoativos.

A maneira simples do ponto de vista regulatório, compliance e custódia são os ETFs de criptoativos.

Além dos ETFs norte-americanos citados aqui nesse artigo, também existem alguns ETFs já disponíveis em corretoras brasileiras.

Quanto alocar em criptomoedas do portfólio total?

Nos Estados Unidos o portfólio mais popular é o 60/40, em que são alocados 60% em ações e 40% em bonds, títulos da dívida do governo.
Esse cenário é diferente do Brasil pois os Estados Unidos tem um histórico de juros menores e as ações americanas também costumam ter desempenho maiores que a das brasileiras.
Dentro desse portfólio dos Estados Unidos, sendo Matt Hougan, CIO da Bitwise, desde 2018 os institucionais buscavam alocação em Bitcoin em até 1%, porém recentemente o mercado focado em wealth management começou a aumentar essa alocação para 3 e 5%, devido à maturidade do mercado. Entretanto, institucionais mais conservadores como fundos de pensão ainda estão mirando alocação abaixo de 1%.

No Brasil apesar de não existir um portfólio popular como o 60/40 e muitos portfólios terem 50% a 70% de renda fixa, acredito que os percentuais de alocação de Bitcoin e criptomoedas de até 1% para fundos mais conservadores e até 5% para fundos mais arrojados fazem bastante sentido.
Em relação aos Estados Unidos ainda temos a desvantagem de ter no Brasil investimentos baseados em sua maioria em reais, que tem histórico de se desvalorizar em relação ao dólar.
Considerando esse últmimo cenário é portanto bastante interessante ter criptomoedas funcionando também como um hedge para nossa própria moeda corrente.

Exemplos de institucionais que estão integrando criptomoedas no portfólio.

Um dos principais investidores institucionais do IBIT é o Banco do Brasil.
Segundo Eric Balchunas, analista sênior da Bloomberg, aproximadamente 30 investidores institucionais compraram cotas desse fundo da maior gestora de ativos do mundo. Mas esse número pode ser bem maior porque nem todos divulgaram ainda.
Além do BB, o BTG Pactual também está nessa lista de investidores institucionais.
Para citar também um exemplo nos Estados Unidos, o BNY Mellon, banco mais antigo do país que possui 45 trilhões de dólares sob custódia também está investindo em ETF de Bitcoin.

Perspectivas futuras para criptomoedas no setor financeiro institucional

O grande ativo digital do momento é o Bitcoin, pois além de ser a pioneira e atualmente a maior em capitalização de mercado, foi a primeira a ter um ETF à vista aprovado nos Estados Unidos.
O próximo sério candidato a ter um ETF aprovado nos EUA é o Ethereum e no Brasil esse ativo já está disponível também em ETFs.
Porém o mercado de criptomoedas e blockchain vai muito além disso.
Conforme mencionado acima, Larry Fink, CEO da BlackRock, já tokenizou um fundo na Rede Ethereum e ainda profetizou que no futuro todos os ativos financeiros serão tokenizados.
Esse é o momento em que todos do mercado financeiro deveriam estar olhando para esse mercado, tanto como oportunidade de investimento para o portfólio como também para integração de novas tecnologias blockchains em suas empresas.

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Pravatta

Cripto Analista Estrategista | Engenheiro Eletrônico entusiasta de economia, tecnologia e criptomoedas https://meulink.fit/fFznSKXqLoyJRuj